15 November 2008

Minha primeira morte por Helen


Texto produzido durante a oficina de teatro e produção de texto a partir da obra "A Hora da Estrela" de Clarice Lispector, por Gabriel Henrique.

O ódio havia me domado naquele momento, em que meus olhos se encheram de dor. Havia se passado seis anos desde o fracasso da campanha marítima. Eu havia saído daquele mesmo porto como um herói da marinha naval inglesa, mas agora retornava como um traidor holandês de uma caravela roubada. Maltrapilho e agora tonalizado pelas cores do bronze feitas por tantas terras em que o sol castigava, me encontrava da forma que já era de se esperar. Era a mesma Helen em que eu havia deixado no cais, que aos prantos pedia apenas para que eu voltasse. Mas já era tarde, por mais que me amasse não suportaria a luta contra o tempo. Seu corpo que refugiava do frio sobre a capa era entrelaçados por mãos de um outro amante.
Talvez o impacto não fosse tão grande pelo fato de minha amada, desiludida pela minha morte, procura-se o conforto nos braços de um pretendente qualquer que lhe oferecesse um dote que animasse seu pai. Mas como havia dito, assim não fosse tão grande quanto o fato de que o homem fosse um conhecido. A quem eu devia juramento de sangue, quando tocamos em terra santa e partilhamos de um mesmo corte de nossas mãos, um elo de eterna amizade. Assim como crianças Caio e Marco e da mesma forma adulta como César e Brutus. Naquele instante eu não sabia o que havia se passado por todo esse tempo, mas depois eu havia descoberto que fora um favor de David.
Eu havia deixado Helen aos cuidados de seus pais que nada podiam oferecer a não ser um teto de palha e o gado doente e escasso. Deixei tudo que pude, mas não passavam de farelos que não conseguiam enfartar nem ao menos uma andorinha. Não naquela tarde fria de outono, ela vestia o melhor oferecido pelas especiarias das terras distantes. E sorria. Não havia preço para se ver aquele sorriso.
Não conseguia reagir, fiquei imóvel por algum tempo e então senti aquele fogo que vem de dentro, que por muito é mais ardente do que o hidromel mais velho de toda Bretanha. Pensei por um instante, e foi tão forte a emoção que não havia percebido, que eu levantara a bainha de minha cimitarra. Olhei para a lamina que refletia um homem desgastado pelo amor que mesmo ao seu lado, estava fora de alcance.
Amei Helen assim como César venerou Cleópatra. E tanto a amei que cheguei ao estado da loucura, eu estava morto, e mesmo o coração palpitando pelo sangue quente que circulava, eu apenas vagava sobre as terras que um dia fui lembrado e saudado.
Guardei a face daquela espada que derramou o sangue de tantos inimigos e irmãos e voltei ao meu sofrimento. Dei meia volta e segui para o lugar, onde apenas aqueles que existiam iam. E mergulhei no delírio da chama falsa de mais um vinho, eu não bebia rum. Era uma bebida refinada pelo sofrimento e trafegada por homens sem honraria. O vinho é criado todos os dias, um de seus vários criadores um dia já sofreu por uma mulher. Era o que eu sempre dizia “São necessários milhares de homens para se construir um império e apenas uma mulher para destruí-lo”. Meu império havia caído. E eu sabia que não poderia reconstruí-lo. Não sou nada sem minha Helen. Não sou Arian. Eu não sou, apenas existo.

No comments: